Encerrado no último sábado (18), o Campeonato Mundial de natação paralímpica, em Funchal (Portugal), foi o primeiro grande evento da modalidade desde a aposentadoria do multicampeão Daniel Dias, após a Paralimpíada de Tóquio (Japão). O desempenho brasileiro na Ilha da Madeira confirmou o cenário observado na capital japonesa: uma dependência, cada vez menor, dos resultados de um ou dois nadadores para a classificação no quadro de medalhas.
Nos quatro Mundiais realizados entre 2010 e 2017, Daniel e André Brasil foram responsáveis por 45 das 54 medalhas de ouro conquistadas pelo Brasil (83,3%). Em Paralimpíadas, a importância foi ainda maior, já que apenas eles foram ao topo do pódio (21 vezes ao todo, sendo 14 com Daniel e sete com André) nas três edições realizadas de 2008 a 2016.
Sem André no Mundial de 2019, em Londres (Grã-Bretanha), após o nadador ser considerado inelegível nas provas em que é especialista, o Brasil saiu do top-10 do quadro de medalhas depois de quatro edições, ficando em 11º. Afetado por mudanças nos critérios para classificação funcional (processo que define a categoria do atleta pelo grau da deficiência), que levou nadadores considerados, anteriormente, menos comprometidos fisicamente que ele, para a mesma classe, Daniel foi responsável por um dos cinco ouros brasileiros naquela competição, que teve a então estreante Carol Santiago como destaque (com duas láureas douradas), além da presença de Edênia Garcia e Wendell Belarmino no topo do pódio.
Os resultados sinalizaram que o Brasil precisaria ir além de seus maiores nomes para seguir em alta. Os Jogos de Tóquio deram a resposta: cinco atletas diferentes responsáveis pelas oito medalhas douradas na capital japonesa, o dobro do amealhado no Rio de Janeiro, em 2016, quando somente Daniel conquistou ouros (quatro). Carol e Wendell voltaram ao topo, agora na estreia paralímpica de ambos, sendo que a velocista da classe S12 (baixa visão) esteve lá três vezes. Na segunda Paralimpíada da carreira, Talisson Glock ficou com o ouro pela primeira vez. Revelados após o Mundial, os “Gabrieis” Araújo e Bandeira também debutaram com estilo no evento.
Já no Mundial deste ano, o Brasil teve 15 campeões entre os 29 integrantes da delegação que viajou a Portugal, sendo sete em provas individuais: Carol Santiago, Cecília Araújo, Gabriel Araújo, Gabriel Bandeira, Gabriel Cristiano, Mariana Gesteira e Samuel Oliveira. Apenas três dos nadadores retornaram ao Brasil sem medalhas. Ou seja: quase 90% dos brasileiros estiveram no pódio em Funchal.
O detalhe é que a pluralidade de ouros (19 ao todo) não impediu que o Brasil seguisse com seus multimedalhistas. Carol, por exemplo, foi ao pódio sete vezes, seis delas no topo. Os “Gabrieis” Araújo e Bandeira, além de Samuel, levaram cada um três láureas douradas, enquanto Mariana ganhou outras duas.
Os campeões da Ilha da Madeira também simbolizam presente e futuro da natação paralímpica brasileira, que foi para o Mundial com mais de um terço (35%) da delegação formada por nadadores com menos de 23 anos, seguindo a renovação iniciada em Tóquio. Os dez atletas do recorte foram medalhistas e metade foi ao topo do pódio. Entre eles, Samuel, de apenas 16 anos, que tem brilhado na classe S5 (a mesma em que Daniel Dias competia antes de se aposentar).
É verdade que China e Rússia, duas das maiores potências da modalidade, não estiveram em Portugal, ainda que por razões diferentes. Os chineses não costumam disputar o primeiro dos dois Mundiais do ciclo, mas devem marcar presença no do ano que vem, em Manchester (Grã-Bretanha). Já os russos estão suspensos pelo Comitê Paralímpico Internacional (IPC, sigla em inglês), devido à invasão militar à Ucrânia.
Ainda assim, o Brasil deu, sim, um salto em relação a Tóquio, superando britânicos e australianos (que ficaram à frente na Paralimpíada) no quadro de medalhas do Mundial. Já no total de pódios (53), os brasileiros ainda obtiveram 13 a mais que os Estados Unidos, que só terminaram à frente pelo número de ouros (24 a 19).
Em um ciclo reduzido, impactado pela pandemia do novo coronavírus (covid-19), os resultados na Ilha da Madeira trazem otimismo à natação paralímpica brasileira pensando nos Jogos de Paris (França), em 2024. A prospecção de talentos nas Paralimpíadas Escolares, a maior atenção às categorias de maior comprometimento físico-motor (Gabriel Araújo, por exemplo, é fruto de ambos) e o aumento do protagonismo feminino na seleção explicam o desempenho. Mais plural que nunca, o Brasil deixou o Complexo de Piscinas Olímpicas de Funchal consolidado como potência da modalidade.
Agência Brasil
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